1- “Drácula de Bram Stocker” (1992) de Francis Ford
Coppola.
(No século XV, um líder e guerreiro dos Cárpatos
renega a Igreja quando esta se recusa a enterrar em solo sagrado a mulher que
amava, pois ela se matou acreditando que ele estava morto. Assim, perambula
através dos séculos como um morto-vivo e, ao contratar um advogado, descobre
que a noiva deste é a reencarnação da sua amada. Deste modo, o deixa preso com
suas "noivas" e vai para a Londres da Inglaterra vitoriana, no
intuito de encontrar a mulher que sempre amou através dos séculos) - 1
Francis
Ford Coppola, para fazer diferença em relação a tantos filmes de vampiros já
feitos, aceitou um roteiro bastante próximo do romance de Bram Stocker, que lhe
foi mostrado por Wynona Ryder.
Visualmente
o filme é deslumbrante. Existem elipses incríveis e insuspeitadas que eclodem
aqui e ali.
Para
quem não compra as premissas do filme facilmente, as razões do porquê surge
Drácula convocando todas as forças das trevas, bebendo sangue, afrontando o
cristianismo que passa a odiar, porque sua amada suicida não pode ter enterro
cristão e ainda se tendo um salto de quatro séculos, com o vampiro já reinando
em sua mansão gótica na Transilvânia.....não se deixará convencer e será difícil embarcar na viagem
proposta por Coppola.
Ainda
mais que há ainda o dado inquietante de que a amada Elizabeta passa por
reencarnações sucessivas até chegar a ser Mina ( Wynona Ryder), depois destes 4
séculos. Algo que o filme nos propõe e precisamos comprar.
Há
momentos em que o apuro visual soa até excessivo, por demais transbordante. Ao
final, temos uma longa perseguição em carruagens, que nos remete a westerns.
Não
conheço o original de Bram Stocker. Copolla diz em extra de DVD que conhecia o
livro desde a adolescência.
Assim
existem belos e intrigantes momentos em que acredito estar no original, segundo
proposta de Coppola. Ou não, pois faria parte das chamadas liberdades poéticas.
O fato é que nunca vi algo assim, relativo a vampiros.
Quando
Drácula é encurralado por Van Helsing (Anthony Hopkins, o professor que detinha
o conhecimento sobre a existência de vampiros) e seus auxiliares, ele se
expande para ficar um monstro terrível, ameaçando todos. Depois se dilui em
vários ratinhos, que fogem pelas pernas dos que o iriam atacar.
Em
outra oportunidade Drácula entra nos aposentos de sua amada, Mina/Elizabeta, que
agora ele enxerga como em reencarnações de 400 anos, como névoa pela janela, entra pelos lençóis e
se materializa, deitado sobre ela, como o vampiro que é, mudando o destino da
amada.
Drácula
reina em seu castelo na Transilvânia, depois de ter sido herói cristão na
guerra contra os turcos dominantes, mas há um forte desentendimento,
decorrência de falta de real informação, algo que remete a “Romeu e Julieta” de
Shakespeare, dado que Elizabeta se mata, ao imaginar o amado morto. Sendo-lhe
negado enterro cristão, como já comentado, fará o amante cultuar as trevas para
toda a eternidade.
Num
salto na narrativa de 400 anos, Drácula surge com rosto bem envelhecido, num
excelente trabalho de maquiagem. Isto não impedirá que quando passear pela
cidade tenha seu rosto de quatrocentos anos atrás, como um disfarce, emanando
uma aura, uma força misteriosa de atração que faz com que Mina se apaixone por
ele, mesmo tendo casamento marcado.
É
nesta história de amor por Elizabeta que o Príncipe das Trevas enxerga/recupera
em Mina, que o torna mais humano.
É
nesta condição, nos momentos em que ela se afasta, até para um casamento, que a
enorme solidão do protagonista se acentua.
As
histórias sobre Drácula, enquanto parábolas, nos remete às questões filosóficas, como se seria bom
realmente uma vida eterna na Terra?
O
Drácula de Coppola é bastante vulnerável à cruzes e estacas no coração, mas não
tem problemas com a luz do dia.
Há
um encaminhamento para uma suis generis
redenção, o que pode decepcionar
alguns, mas é algo totalmente coerente com a história.
Coppola
fez questão de não se valer de recursos digitais e mesmo assim temos um
banquete visual. Efeitos digitais poderiam tornar o filme frio, o que
decididamente ele não é. Ainda mais que é uma belíssima e bastante original história
de amor romântico, num clima gótico exacerbado.
Faço
uma distinção entre clássicos e obras-primas. Nem sempre estes conceitos
caminham juntos. Não importa, por exemplo, que juízo de valor se fará a “E o
Ventou Levou...” (1939) de Victor Fleming daqui a 100 anos. Mas não poderão
retirar-lhe o status de clássico do cinema.
Já,
há autênticas obras primas do cinema que
poderão cair no esquecimento, como por exemplo, “Pierrô, Le Fou” (1965) de
Jean-Luc Godard, perdido que pode ficar na imensa obra do diretor.
Já,
há muitos filmes de Bergman como
“Morangos Silvestres” (1957), “Fanny e Alexander’ (1982), “Gritos e Sussurros”
(1972), dentre outros, que, acredito, manterão o status de clássicos e obras primas.
“Drácula
de Bram Stoker” não é livre de críticas.
Há
um excesso de fusões que mesmo magníficas instauram confusões.
Keanu
Reaves como Jonathan é um caso claro de “miscasting”. Coppola diz em extra do
DVD que queria alguém que encantasse as espectadoras jovens...Tiro pela
culatra.
Sendo
muito novo e frágil (se revelaria bom
ator mais tarde), soa até inverossímil, até mesmo dentro da lógica de fantasia
do filme, que ele não abandone logo a mansão fúnebre, se deixe levar e acabe
ficando, até se ver realmente enredado, pelas ninfas do conde.
Mas
estas ninfas são ainda vampiras? Jonathan passou a ser vampiro também? Sobre
isto o filme não nos dá pistas. E obviamente Coppola não pensaria numa
sequência, onde o que estava encoberto ficaria mais claro e novas
circunstâncias surgiriam.
O
Van Helsing de Antony Hopkins tem momentos (poucos) que resvala para a
histeria.
As
imagens são propositadamente overs. Mas mesmo dentro deste espirito, ocorrem
excessos fortes que até atrapalham a narrativa.
Mas
o filme em seu conjunto é tão bom e vindo de Coppola, sendo seu único filme no
gênero, com vários elementos de originalidade em relação a tudo que se viu
antes e depois, que estamos diante de um autêntico clássico, ainda que seja uma
obra-prima bastante imperfeita.
2-
“Nosferatu- O Vampiro da Noite” (1979) de Werner Hersog
(Jonathan
Harker (Bruno Ganz) é enviado ao castelo do conde Drácula ( Klaus Kinski) para
lhe vender uma casa em Virna, onde mora. Mas o conde é um vampiro. Inspirado
por uma foto de Lucy Harker ( Isabelle Adjani), mulher de Jonathan, Drácula se
muda para Virna, trazendo morte e destruição)- 2
Com
incrível máscara facial, sem a necessidade de ser carregada de maquiagem como o
Drácula de Coppola, Klaus Kinsk compõe um vampiro bastante assustador. Mas o
filme de Herzog é propositadamente frio. Nosferatu é uma criatura gélida, de
gestos lentos e dissimulados.
O
Drácula de Coppola é quente, caloroso, romântico, com ar zombeteiro, mas que
exerce mesmo toda sua crueldade quando acredita que deve empregar seus
poderes.
Nosferatu
sai de seu castelo, entre vários caixões, num barco e vem à a pequena cidade Virna,
para encontrar Lucy, por quem se apaixonou e traz muitos ratos que espalhados,
provocam uma peste com muitas mortes.
E
Hersog consegue aqui, algo bastante comum em seus filmes: beleza e poesia que pode surgir de situações
bastante dramáticas e de criaturas de exceções, que se pode considerar
“hersoguianas”, muitas delas vividas por Klaus Kinsk. Mas este adjetivo pode
ser aplicado também a Stroszeck, Kaspar Hauser e Woyzeck, como exemplos.
Um
exemplo que me vem logo à mente é o espetacular e belíssimo desfecho de
“Aguirre- A Cólera dos Deuses” (1972) onde este homem impiedoso, de olhar
ensandecido, que não tinha escrúpulos para chegar a um Eldorado almejado cheio
de ouro, sacrificando tudo e todos que encontrasse pelo caminho, termina
sozinho num pequeno barco reinando para macaquinhos. De beleza trágica
inaudita.
Um
inesperado sacrifício vai conduzir o destino de Nosferatu.
De
forma minimalista, Hersog dá sua visão particularíssima do mito, onde Kinski
encarna mais um anti-herói que conduz uma narrativa. Um filme muito bom. Mas
obras-primas de Hersog são “O Enigma de Kausper Hauser” (1974), o já citado
“Aguirre- A Cólera dos Deuses”, dentre outros.
3-
“A Dança dos Vampiros” (1967) de Roman Polanski
(Abronsius
(Jack MacGowran) é um professor universitário especialista em vampiros que
decide ir até a Transilvânia, no coração da Europa Central, acompanhado de seu
fiel discípulo Alfred (Roman Polanski), que infelizmente é bem medroso.
Abronsius tem como objetivo aprender sobre vampiros e combatê-los, se possível,
mas os fatos tomam um rumo inesperado e vão de encontro aos objetivos do
professor.) -3
Este
filme de Polanski é um primor de humor negro. Logo nos créditos temos o tom do
filme. Lágrimas de sangue saem dos olhos do leão da Metro, após seu rugido e vão
caindo, caindo, pontuando os letreiros.
O
sequestro de Sarah (Sharon Tate) na banheira é mais que assustador do que
cômico. E é este fato que vai catalisar os movimentos da singular narrativa,
uma autêntica comédia de erros, em que o que parecia ser uma solução, se torna
grande equívoco, com suas indesejadas consequências, que muitas vezes não primam
pela sutileza, mas forte humor e espanto estão sempre presentes.
Polanski
nunca foi um cineasta convencional em qualquer título de sua obra. Aqui temos
um desfecho desconcertante, que outros cineastas evitariam. Mas aqui é puro
Roman Polanski.
4-
“Vampirização” Entre os Seres.
O
texto “Baixa autoestima propicia "vampirização"-4 , citado dentre os links do item 5, mais abaixo,
nos passa bem, ideias do que aqui tratamos, mas sob o ponto de vista de filmes
variados.
Um
dos cineastas que mais lida com esta questão da “vampirização” do outro é
Walter Hugo Khouri, principalmente com seu alter-ego Marcelo. Este mais do que
o prazer sexual que busca com inúmeras mulheres ( se valendo do seu poder
econômico), da busca de um desesperado
afeto que lhe aplaque a solidão e sua crise existencial, tem o prazer de “vampirização”,
algo mais que humilhação, das mulheres que cedem aos seus encantos.
Mas
é um machão bem particular, pois para tornar mais forte o desejo das mulheres
por ele, ele tem a preocupação de fazer as “suas” gozarem bastante. De família
bem rica, tendo estudado e com certa cultura faz desta, vamos escrever assim, “erudição”,
mais um uma arma para suas conquistas, confundindo-as.
Existe
desde as prostitutas que contrata, as mulheres em busca de aventuras. Mas as que
mais sofrem são as que se apaixonam realmente por ele.
Khouri,
em vida, foi bastante atacado por parte da crítica ( a carioca principalmente,
com Ely Azeredo com uma das saudáveis exceções), pois faria um cinema alienado
e plasmado do cinema de Antonioni.
Nunca
concordei com isto. Khouri ao nos apresentar angústias da burguesia paulistana
bem rica, o relacionamento dela com classes baixas, além de cobrir temas que
não vemos facilmente em outros filmes brasileiros, nos mostra o quanto questões
existenciais são universais. Só a burguesia italiana estaria sujeita a estas angústias?
O
próprio Antonioni nos mostra o quanto estas angústias, o vazio existencial,
podem ocorrer também em meios proletários, como ocorre com o protagonista de “O
Grito” (1957)- 5, que, depois de em sua vida nômade, passar por várias
mulheres, não conseguindo estabilização com ninguém e perdendo a que realmente
amava, acaba optando pelo suicídio.
“O
Corpo Ardente” ( 1966)-6 (segundo Andrea Ormand, pesquisadora do Cinema
Brasileiro), era o filme seu de que
Walter mais gostava e há assumida influência de Antonioni.
Mas
há tantos elementos originais e digamos “brasileiros”, como os simbolismos que
um cavalo bem preto indomável, desaparecido e uma égua no cio bem branca para
atrair o fugitivo trazem, além de uma festa indesejada “que nunca termina”, que
“desaparece e volta no tempo”, sendo subsequente à temporada no campo, que pode-se falar sim de diálogo e
não imitação barata.
Uma
das marcas fortes do Cinema de Khouri são os insistentes closes em seus
personagens nas mais variadas situações, numa criação de climas bastante
singulares.
Um
texto- 7 bastante interessante sobre o Cinema de Walter Hugo Khouri (com
referência ao livro de Pucci Jr, “O Equilíbrio das Estrelas”, uma edição Anna
Blume/Fapesp, sobre o diretor, seus filmes, a receptividade) nos é apresentado
no item 5 com links variados.
Se
por um lado foi bastante criticado, Khouri é um dos cineastas mais premiados no
Brasil, com vários prêmios Governador do Estado”, três como melhor filme pela
APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte), Coruja de Ouro etc. E
prêmios para suas atrizes também. Vide 8, para um panorama em geral.
Se
não ganhou sempre como melhor filme, seu trabalho como diretor, argumentista e
roteirista foi várias vezes reconhecido.
Em
“O Último Êxtase” ( 1973)- 9, Marcelo nos é apresentado como um jovem de 18
anos, que começa a ter desilusões amorosas, ao mesmo tempo em que se depara com
a crueldade de pessoas de meia idade, que não se importam com os sentimentos
dos outros.
Ao
mesmo tempo que se mostram solícitos, querem enredar Marcelo, sua namorada, o
amigo e sua companheira, em suas tediosas teias de aranha. Marcelo é o que se
afasta de tudo, indo embora sozinho, com carona sobre a lona de um caminhão,
junto à sua mochila, não sabendo mais o que será de sua vida. Se antes se
mostrava altivo, curioso pelo que vê em São Paulo, mas por fim, fica de bruços
chorando.
Ele,
ao contrário do que vemos nos filmes enquanto adulto, acabou sendo aquele vampirizado
por outras pessoas, incluindo os jovens que eram seus amigos. Mas percebe logo
o jogo e larga todos.
“O
Convite ao Prazer” (1980)-10, é um dos filmes de Khouri mais acessíveis ao
grande público, mas que mantem constantes suas mesmo assim, na histórias de
dois amigos de meia idade que se reencontram depois de uns 4 anos, para marcar encontros
com muitas mulheres na enorme garçoniere de Marcelo, riquíssimo. O outro,
convidado, é um dentista, Luciano, que para economizar fazia da cadeira de
dentista seu modo de transar com mulheres. Mas isto antes de conhecer as
facilidades que Marcelo lhe proporcionará.
O
desenvolvimento das situações se passa com um filme erótico, com alguns poucos
toques de comédia de costumes, onde a postura das duas mulheres destes amigos,
vai determinar o término destes conflitos. Os inerentes à esta história, pois
Marcelo continuará cínico, predador, perverso, insaciável, um vampiro de almas
e corpos, como veremos em filmes posteriores do cineasta.
Em
“Eros, o Deus do Amor” ( 1981)- 11, um
filme bastante complexo, Marcelo surge em câmera subjetiva, com voz em off e
silhuetas de Roberto Maya. Somos colocados em seu lugar e várias mulheres
conversam, desabafam, debocham e o criticam até de forma bem ácida, como a
personagem de Norma Benguell que lhe diz: “Você não é mal. Você faz mal”.
Uma
de suas amantes lhe diz; “Você Marcelo só existe daqui pra baixo”. Até sua
filha Berenice lhe alfineta: ‘Não sei se você é inexpressivo ou cínico”.
No
preâmbulo de “Eros....”, vemos imagens significativas de São Paulo enquanto
cidade grande, que chega a assustar. Marcelo à medida que a descreve em off,
nos apresenta os pontos de contato de sua alma, sua personalidade, seu caráter
com ela. Antológica sequência do Cinema Brasileira.
Em
“Persona” -12 (1966) de Ingmar Bergman, Elizabeth Vogler ( Liv Ullmann) é uma
atriz que numa encenação de Electra, perde a voz. Depois de três meses de
silêncio, por decisão da sua psiquiatra, vai para uma casa de campo, para se
recuperar.
Ali
estará sob os cuidados da enfermeira Alma (Bibi Andersson). Esta acaba
adquirindo uma confiança tal que passa a fazer confissões sobre circunstâncias com
sexo com desconhecidos, em que se viu ao fim humilhada. Mas tanto ela como nós
espectadores, passamos a perceber que Elizabeth ouve tudo com desdém, sem
interesse verdadeiro nos sentimentos expostos. Uma carta escrita por Elizabeth
vai confirmar isto.
Enfim,
aquela mulher que julgávamos ser frágil. vampiriza Alma, querendo fazer dela um
objeto de estudo, mantendo a superioridade de classe social, sem solidariedade
com quem está junto a ela, se esforçando para ajudá-la.
Há
uma sequência bastante significativa em que Elizabeth deixa, após a quebra de
um copo, cacos de vidro na entrada da casa, propositadamente, para Alma pisar.
Em
“Relações Perigosas” (1988) - 13, de Stephen Frears, o Visconde de Valmont
(John Malkovich), junto com a Marquesa de Merteuil (Glenn Close), com variados
interesses, manipulam direta ou indiretamente os sentimentos de pessoas da
corte, conduzindo tudo a uma tragédia.
Merteuil
olhando-se no espelho, borrando a maquiagem da face, odiando a si mesma pelo
que se transformou, é algo que não se esquece.
Em
“O Anjo Azul” (1930)-14, de Josef von Sternberg, o professor Immanuel Rath
(Emil Jannings) procura acompanhar os movimentos de seus alunos e acaba
chegando ao cabaré “Anjo Azul”, onde reina a dançarina Lola Lola ( Marlene
Dietrich).
Lola
Lola percebendo as grandes carências que ele tem, numa sucessão de atos calculistas
e aproveitadores, vai levar o professor à suprema decadência moral. Lola Lola sente grande prazer neste jogo de
humilhações que perpetra. Ele perde o emprego e passa a não ter nada, subjugado
a quem no fundo não lhe dá o menor valor.
Em
“O Criado” (1963)-15, de Joseph Losey,
baseado num roteiro de Harold Pinter, Tony (James Fox), homem rico, se muda
para Londres e contrata Hugo Barret (Dirk Bogarde) como seu criado para várias tarefas
da casa.
Em
princípio Tony se impõe, mas Hugo vai percebendo brechas por onde explorar.
Assim Tony será totalmente dominado, com o decorrer da narrativa.
Não
há aqui somente um processo de lutas de classes. Hugo quer sentir o gosto de
poder humilhar aquele que julgava que o humilhasse.
Há
também um tom velado de homoerotismo no ar. Hugo tem sua amante, que de início
apresentou como irmã e passaram a dominar a casa. Mas Tony pode ter se deixado
levar por esta inversão de papéis, porque há uma atração homoerótica não
realizada, que só tem concretude na patente dominação.
Em
“Cosmópolis” (2012)-16, de David Cronenberg , Eric Packer (Robert Pattinson), jovem
gênio que ganhou muito dinheiro no mundo
financeiro, numa metrópole em caos total, não sabe e nem quer saber nem quem é
o presidente da República, nem do sofrimento de ninguém.
Ouve pessoas
desesperadas, mas nada disto o comove.
Seu
intento, bastante ‘nobre” e “prioritário” dentro do estado das coisas, é
atravessar incólume, por toda esta grande
confusão, numa grande limusine e chegar ao outro lado da cidade, para
cortar os cabelos.
Até
mesmo serviços especiais como exames urológicos chegam até ele na limusine,
incluindo os préstimos de uma prostituta ( Juliete Binoche em rápida aparição).
“Baseado
Numa História Real” (2017)- 17, de Roman Polanski nos apresenta Belle ( Eva
Green) como uma ghost-writer que, de forma bastante insidiosa, vai se
aproximando da conceituada escritora Delphine (Emmanuelle Seigner), que acabou
de lançar um livro de sucesso, mas passa por profunda e depressiva crise
criativa.
Com
sequenciais subterfúgios Belle vai morar no apartamento de Delphine, sempre
bastante solícita, mas aos poucos vai enredando a escritora numa teia de
aranha. Um fortíssimo ato de “vampirização”.
O
filme adentra o terreno da paranoia, tema caro a muitos filmes do diretor. O
mal é tão forte quanto se insinua? Pode ser detido por um processo de elevação
da autoestima? Ou já se tem uma situação irreversível?
O
desfecho faz jus ao universo de Polanski que conhecemos, grande amante do
efeito de câmeras subjetivas. Mas aqui traz algo mais raro em sua imensa e
genial filmografia.
Em
“O Amor Não Tem Sexo” (“Prick Up Your Ears”) ( 1987)-18, de Stephen Frears, o dramaturgo Joe Orton ( de
“O Olho Azul da Falecida”, “Entertaining Mr Sloane”, dentre outras), cada vez
mais se torna prestigiado.
Temos
aqui recuperação de elementos de uma história real.
Mas
Joe é bastante sagaz e sarcástico em sua obra, nada ingênua, em sua vida
particular não percebe o quanto o seu sucesso que se expande, incomoda o
companheiro, que fica com inveja patológica. Nem Peggy( Vanessa Redgrave),
grande amiga do casal se dá conta do que está sendo gestado.
Kenneth
( Alfred Molina) simplesmente mata Joe
(Gary Oldman) e se suicida.
Em
discussões de relações amorosas pode haver alternâncias que levam a baixa e
alta estima, mesmo que esta seja ilusória pois se dá relativamente a uma
contenda, podendo logo ser derrubada.
Nestas
situações podem surgir os chamados esqueletos do armário de ambas as partes e
ferir bastante o outro.
Nestas
autênticas gangorras emocionais temos ‘vampirizações” que se alternam
.
Assim
como em postagem anterior “Cenas e Casamento” (1973)- 19, de Ingmar Bergman vem
como eloquente exemplo.
Aqui
Johan (Erland Josephson) e Marianne (Liv Ullmann) trocam todos os
ressentimentos guardados, surgindo até atitudes eróticas do parceiro antes
aceitas,que agora são reveladas como coisas que provocavam repulsa.
Atenção
Spoilers Entre Parênteses.
(Depois
da dolorosa separação, os dois já com outros relacionamentos se encontram
enquanto amantes. Há um clima de apaziguamento, como apreendemos com os dois
sorrindo. Mas quando a vemos num close de frente e ele ao fundo, abaixado, colocando
fogo em uma lareira, percebemos o quanto ela ainda gosta dele e está bastante desconfortável
nesta nova situação.
Ely Azeredo comenta esta sequência bastante
sutil em seu “Infinito Cinema” *; revi o filme e este sentimento está realmente
estampado na tela).
Em
“Sarabanda” (2003)-20, de Ingmar Bergman, Johan e Marianne se encontram vinte
anos depois. Marianne passou a ser mais íntegra em suas emoções, estando uma
mulher mais segura. Já Johan se mostra bastante amargo, com grande medo da
morte.
Um
filme até então não comentado no Blog, pois poderia ter sido significativo no post
sobre discussões de relações **, que pode aqui ser relevante, é “Eclipse de Uma
Paixão” (1995)-21, de Agnieska Holland.
Paul
Verlaine (David Thewlis), um poeta já consagrado, convida o bastante jovem Arthur Rimbaud
(Leonardo DiCaprio) para morar com ele e sua esposa e o convidado se revela um poeta
revolucionário que impressiona bastante Paul.
Apaixonado
tanto pela poesia feita como pelo próprio Rimbaud, Verlaine vê sua vida
desestabilizar por este “anjo exterminador”, seu amante e seu pupilo.
O
grande tumulto da relação, a batalha de cérebros e sentimentos fortes, passa a ser tal que
Verlaine atira em Rimbaud. Este chega a dar parte na polícia, mas como sabemos
larga a poesia e passa a viver uma vida de aventuras, caindo até em situações
perigosas como traficante de armas na África.
As
forças que desestabilizaram a relação amorosa podem ser várias: o receio de
grande repressão da sociedade em que viviam; homofobias internalizadas; explosões
emocionais que ocorrem dirigidas ao outro, quando o alvo mesmo seria o mundo
limitado em que viviam etc.
Como
em outras relações amorosas houve bastante ferimentos antes de ser rompidas.
Em
“Este Obscuro Objeto do Desejo” (1977)-22, de Luis Buñuel, temos um dos mais
interessantes e originais jogos de gato e rato amorosos já mostrados no Cinema.
Mathieu
(Fernando Rey) é um senhor burguês que se sente bastante atraído pela bem jovem
Conchita ( Carole Bouquet/ Ângela Molina, duas atrizes para um mesmo
personagem, onde a primeira soa fria e a outra bem caliente).
Mathieu
pensa estar conseguindo seu intento, mas impedimentos surgem das mais variadas
formas, como depois de arrancar várias vestes de Conchita na cama, a encontra
com um cinturão de castidade.
Atenção
Spoilers Entre Parênteses
(O
apogeu das traições, das humilhações impostas, de Conchita, em relação aos sentimentos de
Mathieu, que como burguês inveterado, só consegue atraí-la com seu poder
econômico, que ela reiteradamente aceita ( e teve incentivo da mãe), se dá quando ela ganha um casa de
presente.
Mathieu
chega até o “presente” e está fechada com as grades expondo parte bem aberta.
Conchita com as chaves na mão, não só não o permite entrar, como traz um amante
(se for alguém ocasionalmente chamado, não tem importância) para transar no chão,
diante dos olhos perplexos do protetor. E de nós espectadores.
Fiel
à estética surrealista, Luís Buñuel nos apresenta um embate que não tem fim. Não
há inocentes nesta história. Ainda que numa mesa de debates da Caixa Cultural, por
ocasião de uma Mostra Luis Buñuel, houve uma participante que viu em Conchita,
uma mulher avançada, empoderada (sic).
Simplesmente
ridículo, Ainda mais que Buñuel em seus filmes está muito mais afeito ao
politicamente incorreto do surrealismo, do que a qualquer vestígio de feminismo.
Desde
quando ser tirana e dissimulada, ganhando bens desejados, enganando homens que se
valem dos poderes do dinheiro etc é um avanço exemplar para mulheres?
Grande
profeta, Buñuel previu a onda de atentados de pretextos religiosos de nossos
tempos: os protagonistas, após mais uma tentativa de reconciliação, tem de correr
do ataque de um assim chamado: “Exército Revolucionário do Menino Jesus”).
Em
“O Palácio dos Anjos” (1970)-23 de
Walter Hugo Khouri, três mulheres, Bárbara
( Geneviève Grad), Ana Lúcia ( Adriana Prieto) e a relutante Mariazinha (
Rossana Ghessa), a mais jovem, se valendo de um fichário do trabalho de onde
Bárbara foi despedida, ganham bastante dinheiro com prostituição, sem
intermediários, como se tivessem uma microempresa.
Bárbara
tinha sido demitida, pois de temperamento bem forte reagiu à altura ao assédio sexual
do chefe. Um dos trabalhos que tinha era se informar ao máximo sobre a clientela
potencial da empresa, descobrindo até hábitos da privacidade destes ricaços,
como gastos com amantes, bebidas e afins.
É
com estes contatos, roubados através de xerox, que acabam se deparando com muitos
homens bastante ricos, dispostos às encontrarem, com Bárbara sempre estimulando
as outras quando perdem a força.
Quando
Bárbara, que controla tudo o que todas ganham, resolve fazer uma grande reforma
no apartamento, este acaba ficando
célebre, num pequeno circuito de ricaços à procura de prazeres, como “O Palácio
dos Anjos”.
Há
o reencontro de Bárbara com o chefe, agora como um cliente que vem conhecer o
tão comentado “O Palácio dos Anjos”.
Ele
propõe uma sociedade da informação com ela. Ela vai se esmerar mais na pesquisa
de ricaços e seus hábitos, ampliando os dois ainda mais suas clientelas.
Esta
forma de prostituição, como extensão de negócios empresariais. O inverso ocorrendo
também. Nada mais atual.
Com
o tempo as ideias empreendedoras vão sofrendo fraturas. A primeira se dá com a
crise de nervos de Mariazinha, que se recusa a realizar fantasias de um
cliente. Bárbara com seu pragmatismo que chega a ser assustador, realiza o que
a outra não quis.
Bárbara
resolve levá-la para passar uns tempos na casa da mãe. Logo surge a pequena
irmã bastante curiosa. Instaura-se um clima de constrangimento no ar. Bárbara põe
três maços de dinheiro na mesa e ainda um cheque.
O
gosto de Khouri por closes bem fechados acaba criando um razoavelmente longo
clima de suspense. A câmera passeia pelos rostos de todos os personagens,
alternando-os, várias vezes. A grande dúvida que paira no ar é se a mãe vai
aceitar o dinheiro, que sabe que procedência teve. Mas ao vermos Bárbara
partindo em seu carro, a resposta fica clara. E cruel. Para os que não tem
saída.
O
desfecho de “O Palácio dos Anjos” é cru, mas bastante coerente com as situações
vivenciadas na narrativa e a evolução (para o bem ou para o mal) dos
personagens.
Aqui
pode-se dizer que tanto as prostitutas de luxo vampirizam os homens (que nem
sabem como foram contatados) e com o dinheiro que tem, comprando-as, as
vampirizam também. Mas não com a intensidade imbatível de Marcelo.
Khouri
consegue o prodígio sempre pretendido de não fazer filmes amorais, imorais e
tampouco moralistas.
Sua
ênfase, sua postura, é sempre tentar compreender seus personagens nas
circunstâncias em que vivem, sem rótulos. Um convite que faz, uma viagem que pede ao espectador
também.
Em
“O Convite ao Prazer”, já comentado, Marcelo sofre uma razoável desforra. Mas é
um acidente de percurso, que vai torná-lo, provavelmente, mais elitista. O acontecido
não vai demovê-lo de seguir por sua “via-crúcis de vampiro”, eternamente
insatisfeito e angustiado.
Nelson-
6/11
PS1-
No Blog http://estranhoencontro.blogspot.com.br/,
Estranho Encontro ( Revisão crítica, histórica e amorosa do Cinema Brasileiro.
E-mails para andrea.ormond@uol.com.br.) de Andrea Ormond, grande
entusiasta do Cinema de Walter Hugo Khouri, há vários textos dedicados a obras
suas.
PS2-
Através do Youtube, pode-se assistir vários filmes de Khouri, desde o início da
carreira aos últimos. A qualidade de definição da imagem varia de filme a filme.
Mas o que está irremediavelmente muito ruim é a de “O Prisioneiro do Sexo”, que
não consegui rever.
Recomento
especialmente “Noite Vazia” (1964) -24, quase que consensualmente, a grande
obra-prima, dentre os filmes do diretor.
5-
Links Associados
1-http://www.adorocinema.com/filmes/filme-5434/trailer-19396274/- “Drácula de Bram Stoker"-Trailer
Original”
2-
encurtador.com.br/hFNV1- “Nosferatu - O
Vampiro da Noite”- Sinopse
2- http://www.adorocinema.com/filmes/filme-1382/trailer-19437561/ Trailer Original - Nosferatu - O Vampiro da Noite-
Créditos
“A Dança dos Vampiros”- Sinopse-Créditos
A
Dança Dos Vampiros (The Fearless Vampire Killers) 1967 Trailer
4- https://mulher.uol.com.br/comportamento/noticias/redacao/2010/03/14/baixa-autoestima-propicia-vampirizacao.htm - Baixa autoestima propicia "vampirização”
5- http://www.adorocinema.com/filmes/filme-1446/ -
“O Grito”- Sinopse-Créditos
7-
http://cultura.estadao.com.br/noticias/cinema,livro-reve-cinema-de-walter-hugo-khouri,20010716p2243
17- https://brasil.elpais.com/brasil/2017/05/27/cultura/1495896075_944320.html - Matéria sobre “Baseado em História
Real” quando do seu lançamento em Cannes.
20- http://www.adorocinema.com/filmes/filme-58532/- “Sarabanda” -Sinopse-Trailer-Créditos
( Na sinopse merece ênfase que Karin é neta e não filha)
21- http://www.adorocinema.com/filmes/filme-14882/- “Eclipse de Uma Paixão” – Sinopse-
Trailer-Créditos
22-http://www.adorocinema.com/filmes/filme-81258/- “Este Obscuro Objeto do Desejo”-
Sinopse-Créditos
23-http://www.adorocinema.com/filmes/filme-194497/ “O Palácio dos Anjos”- Sinopse-Trailer
24-
http://www.adorocinema.com/filmes/filme-235493/
- “Noite Vazia”- Sinopse-Créditos